Durante o século XX, muita gente
acreditava que o mundo não chegaria ao ano 2000. Estava selado o destino
da humanidade. O dia primeiro de janeiro de 2000 serviu de desmentido.
Não
foi diferente no fim do século XIX: qualquer trovão mais ruidoso que de
costume prognosticava o fim dos tempos, que não chegariam a 1900.
Por
essa época não eram boas as referências do Carira, devido às
atrocidades cometidas por Chico Vicente. Foi incumbido o alferes
Bananeira de reprimir os atos daquele criminoso.
Por fim, Chico Vicente matou Zé Tabua e raptou-lhe a mulher. Tempos depois foram mortos em Alagoas.
Eram
tempos obscuros aqueles! Não havia muita diferença entre polícia e
bandidos, dada a violência praticada por gente de ambos os lados.
As
diligências policiais, que em tese trariam segurança, acabavam tirando o
sossego dos moradores do longínquo povoado. O intendente da Vila de São
Paulo, atual Frei Paulo, era o alferes Manuel Hipólito Rabelo de
Morais, morador do Gameleiro, a quem se atribuía extrema severidade no
tratamento dado aos habitantes do Carira. Nem sempre esse abuso de
autoridade foi aceito passivamente. Exemplo disso foram os atritos com a
família de Martinho de Souza, que resultaram em baixas para os
subordinados do alferes.
Vira-se essa página de violência. Mas ainda
antes de Manuel Hipólito deixar a intendência começa Monte a se
celebrizar no crime. Nada o intimidava; nem a dureza dos castigos que o
alferes reservava para quem ousasse desafiá-lo.
Em 1912, ano da morte
de Manuel Hipólito, nomeia-se Francisco Simões de Almeida (Chiquinho
Simões) para subdelegado de polícia. A partir dessa nomeação a
autoridade policial passa a ser um morador do Carira. Atende-se nesse
caso ao interesse do intendente José de Padre.
Em 1915, numa
tentativa de dar cabo de Monte, parentes dele acabam matando sua amásia,
Flor, e ferindo Beijo, filho do casal. Não tardou o revide: com um tiro
de bacamarte Monte põe fim à vida de seu tio Sabino. A extensa carreira
criminosa de Monte não se encerra aqui, mas nos limitamos a tratar dos
crimes que tiveram o Carira como palco. Em meio à tensão provocada por
tanta criminalidade, exercia Manuel Rabelo de Morais a dura e arriscada
tarefa de ser subdelegado de polícia nestes confins de sertão.
Chegamos
a 1918. Avança o século XX, e com ele as mesmas barbaridades. O soldado
Morais tenta, sem sucesso, matar o subdelegado Florentino Rabelo de
Morais (Floro Rabelo). Em seguida deserta para Bebedouro, atual Coronel
João Sá. Esse crime teve a agravante de ser cometido contra uma
autoridade. A subdelegacia passa às mãos de Martinho de Souza.
Entramos
na década de 1920. A teia de intrigas e mortes na região segue
desenfreada, e nela também está o subdelegado Brasilino Meneses. Pela
indisposição com os Isídios, família destas imediações, Brasilino perdeu
um de seus homens, nos atuais limites entre Carira e Frei Paulo . Em
1922, após insultos à família do ex-subdelegado Martinho de Souza,
torna-se inevitável o confronto, que culmina com a morte de Brasilino.
Em
junho de 1923, o comerciante Zé Boteco atira em Jason Tavares, de
influente família frei-paulistana. Dessa vez a razão foram ciúmes: Zé
Boteco desconfiava que sua mulher era seduzida por Jason.
Em dezembro
de 1925, Andrelino, irmão de Monte, assassina o subdelegado José
Conrado de Souza. Revoltado com tamanha audácia e covardia, Antônio
Conrado de Souza (Totonho Conrado), irmão de Zé Conrado, recorreu às
autoridades em Aracaju e obteve apoio para a desforra. O fato de ser
irmão de Monte não livrou Andrelino de ser morto, no Cipó de Leite, onde
se escondia, em janeiro de 1926.
Em 1934, nas adjacências do mesmo
Cipó de Leite, o sanguinário cangaceiro Zé Baiano e comparsas de seu
subgrupo, assassinam, com requinte de crueldade, o fazendeiro Martinho
de Souza e seu vaqueiro, Joãozinho de Vítor. Por esta razão, cinco
filhos de Martinho e alguns parentes formaram uma volante, para
perseguição aos cangaceiros (foto).
Repetimos: eram tempos obscuros aqueles! Maldade e defesa da honra confundiam-se, como se uma justificasse a outra.
Para
composição deste texto, servimo-nos da leitura das seguintes obras:
CARIRA, de João Hélio de Almeida; RETALHOS DE HISTÓRIA, de Olímpio
Rabelo; MEMÓRIAS, de Olímpio Rabelo. Volante
composta por filhos de Martinho de Souza e alguns primos, década de
1930. Foto extraída da obra MOMENTOS DA MINHA VIDA, de Antônio Conrado
de Souza
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