quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Santo Inácio (Carira em tempos de heroísmo)

De 1899 a 1911, a intendência da Vila de São Paulo (atual Frei Paulo) sofreu forte influência do alferes Manuel Hipólito Rabelo de Morais, que por aqui começou a se estabelecer em 1880, com a compra de terras, onde fundou o arraial do Gameleiro.
Por essa época, segundo a tradição oral, os habitantes do Carira sofriam intensa hostilidade da polícia, principalmente aos domingos, na feira: o desenvolvimento do Carira incomodava Manuel Hipólito, que não queria ver prejudicada a feira do Gameleiro. Assim começou o século XX em nossa terra.
A severidade com que o intendente tratava os carirenses causou enérgica reação. Notabilizou-se Martinho de Souza Freire pela coragem de enfrentar a gente do alferes e defender o pequenino Carira.
Outro morador com importante papel nesses confrontos foi o jovem José Antônio dos Santos, apelidado de Santo Inácio. Certa vez, farto das agressivas investidas da polícia, combinou com Manuel Amâncio e com outros amigos uma resposta à altura da arbitrariedade que sofriam. Armaram-se de cacetes e, com extremo ímpeto, expulsaram os soldados na próxima visita indesejada que estes fizeram à feira do Carira. Este episódio consta do folheto intitulado "História de Carira", de autoria de José Francisco dos Santos (Juca de Zé de Santo), neto de Santo Inácio.
Quanto à origem, ele era filho de Antônio Inácio de Souza, membro dos Inácios, família que participou do desbravamento de boa parte do atual município baiano de Pedro Alexandre, em localidades como Quati, Deserto, Tanque Novo, Lagoa das Pedras, Pindoba, Cipó de Leite e outras; e a maioria dos seus irmãos não morava no Carira: Geminiano Antônio de Souza mudou-se para o sul da Bahia, mas deixou filhos em nossa região; João, apelidado de João Grosso ou João das Abóboras, e Sancha moravam em Lagarto; e Rufina residia no Descoberto.
Em Pedro Alexandre, à época pertencente a Jeremoabo, Santo foi dono de duas propriedades: o Campo Formoso e as Abóboras. Esta última foi vendida a Napoleão Emídio da Costa, primeiro prefeito de Frei Paulo. Nos atuais limites entre Pedro Alexandre e Carira, pertenceu a ele a Lagoa da Jurema, próximo aos Perdidos e Divisa; e em Carira, terras no Descoberto, para onde se mudou.
No início deste texto nos limitamos a citar um único atrito entre moradores do Carira e a polícia. Bem sabemos que essa não foi a única demonstração da valentia e coragem de Santo Inácio. Mas a sua mais importante obra foi o cemitério do Descoberto, que perpetuou seu nome. Segundo o senhor Paulo Alves de Oliveira (Paulo dos Perdidos), a pretensão inicial era reservar uma pequena área de terra para o enterro de natimortos ou recém-nascidos que morressem pagãos. Mas pela abertura de algumas exceções, adultos também foram enterrados, e aquela modesta ideia acabou se tornando um cemitério comunitário - Cemitério de Santo Inácio, como ainda hoje o chamamos, não pela consagração ao santo, mas pelo apelido do fundador. Após a morte dele, aquele campo santo passou aos cuidados do seu genro Maximino Alves de Oliveira (Maximino dos Perdidos).
Já se perdeu de nossa memória a data do falecimento desse vulto carirense. José Alves dos Santos (Zequinha do Sorvete), também neto dele, afirma ter sido em 1961, portanto há mais de cinquenta anos. Também já morreram quase todos os seus filhos, bem conhecidos em Carira e região: Ananias José dos Santos (Zé de Santo), sogro do vereador José Francisco da Silva (Zé Guarda); Maria Madalena de Oliveira, mãe do senhor Paulo Alves de Oliveira (Paulo dos Perdidos); Olívia Maria de Jesus; Manuel Martins dos Santos (Manezinho de Santo); Josefa Maria de Jesus (Zefinha dos Olhos d'Água); Genário Antônio dos Santos, pai do comerciante José Alves dos Santos (Zequinha do Sorvete); Margarida Maria de Jesus, única remanescente, com mais de 95 anos de idade; e outros.
A conclusão deste texto não seria possível sem a gentil colaboração dos senhores Paulo Alves de Oliveira (Paulo dos Perdidos) e José Alves dos Santos (Zequinha do Sorvete), netos de Santo Inácio. Aqui expressamos nosso agradecimento a eles e a Gregório Martins Nunes, Cesária Maria dos Santos e Vicencia Maria de Souza, que também nos ajudaram. Pesquisamos as obras CARIRA, de João Hélio de Almeida, e HISTÓRIA DE CARIRA, folheto de literatura de cordel, de autoria de José Francisco dos Santos (Juca de Zé de Santo).
Cemitério de Santo Inácio, no Descoberto, Carira.

Um comentário:

  1. Fiquei muito contente em encontrar essa sua postagem, pois tenho pesquisado sobre a genealogia de minha família e tive conhecimento a pouco, sobre esse cordel da história de Carira. Sou trineta de Santo Inácio e bisneta de Margarida que faleceu em 2016, com 96 anos. Se você tiver mais informações sobre o Santo Inácio ou qualquer outro parente dele, por favor entre em contato: annah_26@outlook.com Muita obrigada!

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